Uma gota de esperança

(Desenho psicografado no dia 26/10/2019  na Casa de Arte e Cultura de São Caetano do Sul)



Na minha história como coordenadora pedagógica tenho sido testemunha de muitas situações que evidenciam o poder enorme que gente grande tem na vida de gente pequena. Entre essas situações, pude conhecer o trabalho da professora Cláudia, numa Escola Municipal da cidade de São Paulo. Abaixo segue um relato dela sobre sua experiência ao perceber através dos estudos como o conhecimento pode nos dar oportunidades de mudar algumas histórias tão arraigadas na mente das pessoas. Ao ler o seu artigo fiquei emocionada por ver  de maneira concreta que o nosso mundo está melhorando através dos impactos positivos na vida de crianças sob o olhar crítico e sensível de uma professora de Educação Infantil.


Relato sobre o curso realizado na Diretoria Regional de Educação do Ipiranga: A Influência da Cultura Africana na Constituição da Identidade Brasileira – uma perspectiva cultural

Cláudia de Carvalho Silva

Há uns dois anos atrás uma colega de trabalho apresentou para nós em uma reunião pedagógica seu projeto de pesquisa que tratava do tema relações étnico-raciais e foi a partir daquele dia que comecei o processo do despertar. Nunca tinha ouvido sobre racismo estrutural e me senti envergonhada ao descobrir do que se trata e notei aqui uma lacuna na minha própria formação. Agora fazendo este curso e lendo o texto da Maria Aparecida Silva Bento “ Branqueamento e Branquitude no Brasil” compreendi o que ela chama de estágios, citando na verdade Janet Helms e fico feliz ao perceber a minha evolução de identidade racial branca não-racista.  

Como educadora tenho o compromisso com meus educandos (com a nossa história de país racista) de tratar sobre questões que envolvam as relações ético-raciais, com ações antirracistas, valorização da cultura africana e afro-brasileira, fortalecendo nossas crianças negras apresentando, por exemplo, através da literatura personagens que eles possam se identificar, apresentar a história da África e da cultura afro-brasileira pela ótica desses povos e não somente a do colonizador, como costuma acontecer na maioria das vezes (como aconteceu na minha formação até dois anos atrás). Quais conhecimentos sobre o continente africano nos foram apresentados no decorrer da vida? Acredito que assim como eu, muitos foram apresentados a uma África onde as primeiras imagens que vem à cabeça são: todas as pessoas negras, fome, miséria, savana, generalizando o continente e desconhecendo sua história na verdade. E ao falar de brasileiros afrodescendentes, o que vem à mente é a escravidão e ponto! Nada mais! Está mais do que na hora de romper com esse ciclo. Vamos conversar sobre racismo sim e combatê-lo. Tenho notado que este convite incomoda. Quando posto algo nas redes sociais fico observando, se é uma bobagem qualquer há uma chuva de cliques, quando é algo relacionado a este tema algumas poucas curtidas ou nenhuma. 

Sobre os resultados de impactos positivos na vida de algumas crianças da minha sala este ano, uma das meninas que é negra de cabelo cacheado, veio confidenciar que não gostava de seu cabelo e que quando crescesse ia alisar. Elogiei seu cabelo, mostrei uma funcionária da escola que estava com seu belíssimo cabelo cacheado solto e comecei a trazer livros infantis que fala sobre cabelos como: Meu Crespo é de Rainha, da escritora Bell Hooks, O Cabelo de Cora de Ana Zarco Câmara e O Mundo no Black Power de Tayó de Kiusam Regina de Oliveira.  Ela ficou tão feliz ao se reconhecer naquelas personagens, falava: Olha o cabelo é de molinha igual o meu! A escola também comprou bonecas negras com peteados Black Power ela logo pegou uma para brincar e no dia seguinte apareceu na escola com os cabelos soltos e radiante de alegria, quase todos os dias essa menina me abraça e fala o quanto me ama. Foi emocionante. Outro caso é de uma criança que a família é de religião de matriz africana, havia lido em certa ocasião o livro OMO OBA História de Princesas da Kiusam de Oliveira, havia um cartaz com a capa do livro e a família pediu para que eu mandasse para casa na maleta do Projeto Leitura. Essa família veio relatar o quanto estava feliz em saber que na nossa escola trabalhávamos valorizando todas as culturas, que estava esperançosa em saber que há este movimento dentro das escolas, pois em anos anteriores a família já tinha sofrido por conta de preconceito religioso. 

Analiso o quanto posso contribuir na vida das crianças e seus familiares com uma pedagogia antirracista. Este movimento de formação antirracista pode ser muito bem representado pelo Adinkra do Sankofa que significa: o desafio humano de retomar e aprender com o passado esquecido e enganado, para transformar o presente e avançar no futuro. 

Referências bibliográficas: 
BRANQUEAMENTO E BRANQUITUDE NO BRASIL In: Psicologia social do racismo – estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil / Iray Carone, Maria Aparecida Silva Bento (organizadoras) Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. (25-58) p.02. 

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